diálogos sem fim para resgatar, me convencer, me acalmar de que, se hoje estou sozinha, foi porque acompanhada caminhava em m'águas turvas.
quarta-feira, 1 de outubro de 2025
sexta-feira, 26 de setembro de 2025
que falação no meu ouvido
e se confirma, então, a teoria de que o adiamento das palavras está num lugar de não querer esvaziar o prazer. ou não também, porque é bem perverso chamar de prazer o que andei sentindo nos últimos dias.
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ontem localizei que a falta não é dos amigos.
é do ruído. da baderna que os outros criam, e me distraem. e eu me traio. não há saudade do um a um.
no mesmo lugar, estão os podcasts. a falação do caralho no meu ouvido.
é que hoje acordei com redesejo da música.
algum pudor me inibia, quando entendi também que era o medo de encarar mais um pouco (mais um) luto. me distanciar das obras que amo e pra onde elas poderiam me levar.
o estado à deriva me enche de medo. medo de descobrir um novo grande amor chamado silêncio. sei que adio esse encantamento pelo vazio.
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eu cuido com carinho da casa que eu não moro mais. por devoção ou memória. por gratidão aos objetos que por mim foram escolhidos, e que hoje enfeitam um espaço que não me pertence. nunca me pertenceu. aprendi a viver bem com a mágoa, coabitar com o ressentimento. não que isso não cobre seu preço.
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passei a tarde com o pai do meu filho. ex-marido, mas ainda companheiro.
atravessamos a tarde juntos com assuntos áridos da nova vida. depois de uma tarde outra, há quinze dias atrás - que guardo com carinho na memória recente, preenchida com ares de amizade profunda e risadas que não cobram nada.
enterramos a tarde na mesma terra que cobria uma discussão ainda fresca na quarta-feira anterior. falas tão mobilizadoras, ao mesmo tempo tão padronizadas. o velho tom escalado rapidamente. (que azar, meu Deus, seria se meu filho tivesse mesmo se chamado Tom, e agora ele existiria em meio a tantas dores que esse texto exala). eu me acostumei com grosserias, seguidas de silencio curto e pedido de desculpas sem reflexão.
e diante dessas palavras, reparo na velocidade dos eventos. mentira. e diante dessas palavras, começo a desmontar as peças do motor dos eventos. em tempos de escassez de assistência para engrenagens ímpares, minha alma existe nesse estado arrítmico há mais tempo que previ.
quinta-feira, 11 de setembro de 2025
não escrever começa a soar como uma evitação ao balanço que eu preciso fazer dos meus dias.
o pai, o trabalho, o trabalho que tenho graças ao meu pai. a carreira que tenho graças ao meu pai. o emprego que tenho graças ao meu pai. assistir este homem dispersar (ele mesmo acaba de me dizer essa palavra) é de uma grandeza daquelas redondas, de quando você se distrai e os olhos perdem o foco num ponto e você não enxerga mais ponto, só umas bolotas se sobrepondo.
acabo de receber a seguinte mensagem dele: "A mamãe sai de figura a partitura b com muita facilidade."
eu sei exatamente o que ele quis dizer.
domingo, 8 de junho de 2025
você vai ver que esse disco vai exalar o cheiro deste agora.
dos dias apressados que fazem caber tristeza, desencontro, feitos modestos e passos duradouros.
dos dias em que não esquenta nem engata o frio.
de um tempo em que a felicidade tem sessenta cores, e que entre elas tem cor que explode no papel - saturada - e o urso, que era pra ser marrom, fica com uma poça de tinta azul bem entre o rabo e sua sacola de mercado.
e aí a gente tem que escolher uma cor que esconda o estrago.
mas logo depois todo mundo se acalma, pois adultos. sobretudo adultos pintando livros de ursinhos. que sabem e admitem que tem estrago bem maior nessa vida - e que volta e meia não tem tinta que cubra.
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a vida se ajustando... e o grande medo do grande fim vem escutando pequenas perguntas que o diminuem mais em menos.
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você já vê que a angústia guarda o lugar da palavra.
e saindo cabisalta, abre caminho pro que me é tão caro: escutar a melodia da memória.
quinta-feira, 6 de março de 2025
quando me deito, eu sei mais. penso na dor, nos medos, escolho o tema da minha próxima análise. rapidamente, por comparação, é claro, reconheço meu percurso, o quão mais sou capaz de ponderar.
flash de memória e volto atrás. relembro como ainda sofro de fantasias megalomaníacas de falta e pesar.
penso no jargão da psicanalista famosa, sobre realidade ser mais mansa que os medos idealizados. ou eu inventei isso? penso no título do livro dela, lembro do outro título mais antigo. me pergunto se são dois pra mesma obra, ou se um foi relançado. lembrei do texto que escrevi em 2021 parafraseando (vaidosa, pensei ‘plagiando’) a coisa de pisar no vazio. algum amigo postou a capa, e eu dei outro rumo.
e dessa sequência de pensares, desse linchamento literário que ensaio começar, volto à angústia dos meus dois últimos dias que foram os primeiros na minha vida dentro da minha vida.
pela primeira vez, a vida eleita. e depois me pergunto porque choro tanto. estou recém nascida.
enfim, me embalo.
pela primeira vez, a vida eleita. e depois me pergunto porque choro tanto. estou recém nascida.
enfim, me embalo.
quinta-feira, 20 de junho de 2024
mamãe querida
quando comecei a escrever essa cartinha tinha lá meus 8 meses. entre um choro e outro, lembrava de te agradecer por repetir tantas vezes que eu não te dava paz. agradecer pela sua fala risonha-nervosa diante da fralda vazada: "Sua xixi". algum tempo depois acrescentei mais uma memória carinhosa: me trancar num quarto fazendo cara de monstro. infinitos os momentos que eu pedia para você parar e nada acontecia senão você repetidamente achando graça de ter uma filha com medo de um monstro construído pela mãe.
tivemos momentos mais comuns como o dia que precisei que um presidente de casa espírita te acalmasse para que você não me batesse por ter escrito na camisa no último dia de aula, do mesmo modo que todos os meus companheiros de sala - exceto os testemunhas de Jeová. eu tinha 6 anos.
a surra por ter medo de panela de pressão; eu me jogando na cama pra apanhar espontaneamente porque meu livro de português tinha sumido; 8 anos.
enquanto sigo essa carta, minha mão estremece de emoção e castração, na tentativa de inibir lembranças que o coração insiste em conservar. mas tenho acreditado na cura pela palavra, na cuspição danada que tem sido desde a ultima quinta em que eu ouvi dele "não recolhe sua trouxinha tão rápido".
quando eu tinha 19 anos eu apanhei dormindo porque você julgou saber meu horário melhor que eu, e chamando de vadia preguiçosa eu fui despertada. achei que seria a última vez. não foi. porque sua palavra segue violenta quando você se vê mais perto da filha desconhecida ou ignorada. ofender até ficar pequenininha de novo. inibir. esconder a criação de si mesma.
estou satisfeita.
passado o rubro outono
deu-se alegria em campo aberto
semeadura espontânea de colheita imediata
dos meus frutos antigos
redescobertos
armazenados em bom estado
galhos crescem no meu coração-corpo
como veias de cadencia desordenada
chamam atenção sem alarido
pintam em tons de terra as letras todas
marcam o solo castigado
tem-se aqui e então a poesia fértil
que o destino tratou de cultivar
em liberdade estranha e reconhecida
herança fraterna daquela morreu viva
semeadura espontânea de colheita imediata
dos meus frutos antigos
redescobertos
armazenados em bom estado
galhos crescem no meu coração-corpo
como veias de cadencia desordenada
chamam atenção sem alarido
pintam em tons de terra as letras todas
marcam o solo castigado
tem-se aqui e então a poesia fértil
que o destino tratou de cultivar
em liberdade estranha e reconhecida
herança fraterna daquela morreu viva
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